— Artur André Lins
Fenômeno perceptível na dinâmica do sistema artístico contemporâneo é o apelo que desfruta a estratégia de valorização das diferenças. O reconhecimento de novas formas de expressão cultural, o incentivo a identidades periféricas, o questionamento de fronteiras conceituais estabelecidas, a contestação da existência de um cânone oficial restritivo são movimentos que caminham na direção do estreitamento, no campo simbólico, entre as dimensões estética e política da produção artística. Exemplar desse processo é a Bienal de Veneza de 2024, que conta com a curadoria assinada pelo brasileiro e diretor do MASP, Adriano Pedrosa. Intitulada Stranieri Ovunque – Foreigners Everywhere, a Bienal mais importante do mundo trouxe à tona uma multiplicidade de modernismos locais, com artistas renomados e outros quase desconhecidos, muitos deles carregando consigo as bandeiras de identidades historicamente sub-representadas: indígenas, negros, mulheres, queers, populares, periféricos, em suma, estranhos ao establishment. Vimos, no Brasil da última década, a intensificação de movimentos semelhantes, com a proliferação de exposições dedicadas a artistas marginalizados, com a recuperação de nomes esquecidos da arte popular e afro-brasileira do século XX, com a inclusão significativa de artistas indígenas na Bienal de São Paulo, com a presença cada vez mais cons- tante de artistas incomuns nas principais feiras comerciais e leilões de arte no país. Em sintonia, assistimos à Bienal Naïfs do Brasil, desde 1992 sediada na unidade de Piracicaba do Sesc São Paulo, cravar um espaço importante de divulgação dos artistas ditos populares, em diálogo com a arte contemporânea, na cena artística brasileira. Contudo, seria decididamente um erro atribuir a essas movimentações um caráter de absoluta novidade histórica.
› Antônio Roseno
Bêbado de chapéu, 1986.
Foto: Artur Lins.
A MARGINALIDADE NAS ARTES VISUAIS
É conhecida a história de que a autonomização da arte ganhou impulso com o Renascimento italiano no século XV. Entretanto, foi apenas com o surgimento do sistema acadêmico de formação, na França do século XVII, que a arte se libertou do domínio das corporações de ofício e do mecenato, adquirindo, assim, uma institucionalidade própria ao estabelecer os critérios de definição da qualidade estética com base no saber teórico erudito. Dominante até meados do século XIX, o sistema acadêmico da arte, espalhado pelo mundo, começa a entrar em saturação e, posteriormente, em declínio. Baliza de uma hierarquia de valores, pautada em um cânone oficial, a arte acadêmica passou a ser vista como excessivamente rígida, em certa medida retrógrada e limitadora do potencial criativo humano. A especialização do sistema de mercado voltado às artes visuais, ainda na Europa do século XIX, promoveu o escoamento do excedente de obras para um emergente público de classe média ávido por novidades antiacadêmicas. Paralelamente, o Romantismo, como movimento estético e cultural, firmava a figura mítica do gênio criativo como protótipo do artista moderno, dotado de um talento espontâneo, com temperamento desobediente, relativamente isolado e socialmente inconformado. É precisamente nesse momento, em face dessas circunstâncias, que a “marginalidade” se transforma em problema para o moderno sistema da arte ocidental.
Os diversos modernismos, no final do século XIX e início do século XX, cristalizaram a ruptura com a Academia. Desse modo, o tema do desvio, paulatinamente, se tornou central. Deu-se início ao movimento de estetização da alteridade. Artistas como Paul Gauguin e Pablo Picasso são emblemáticos desse processo. Abre-se uma busca incessante pelos elementos primordiais da expressão artística: a autenticidade passa então a ser associada à pureza, à natureza humana intocada, ao inconsciente, ao incivilizado, ao selvagem. Disso decorre a aproximação dos modernistas com os primitivos, os insanos, as crianças e os ingênuos. Paradigmática dessa aproximação foi a consagração de Henri Rousseau no Salão dos Independentes na França, em 1910, artista este fortemente incentivado por Picasso e posteriormente considerado o ícone pioneiro da chamada arte naïf. Na década de 1920, começaram as primeiras exposições de escultura africana nos grandes museus de arte dos Estados Unidos. Na mesma década, Hans Prinzhorn formou, na Alemanha, uma coleção de arte asilar que exerceu influência sobre expoentes do Expressionismo e do Surrealismo, como Paul Klee e Max Ernst. Exemplos da afinidade entre os modernistas e os artistas marginais são muitos, incontáveis. Hipoteticamente, isso se deve ao fato de que os próprios modernistas foram, de primeiro, outsiders no sistema da arte.
Em meados da década de 1940, a discussão sobre o valor simbólico da marginalidade nas artes visuais adquire novo estatuto com o empenho do pintor francês, Jean Dubuffet, na proposição de uma cate- goria classificatória: a art brut. Em torno dessa categoria, construiu-se uma coleção de arte que privilegiava criadores socialmente desajustados, principalmente artistas mar- cados por condições mentais patológicas, indivíduos de zonas rurais periféricas, entre outras situações de opressão que conduzem ao isolamento. Em síntese, a art brut reúne um grupo de artistas que seria supostamente imune à cultura artística dominante, alheio ao funcionamento do sistema da arte profissional. O conjunto, portanto, não era definido por propriedades estéticas intrínsecas, mas por fatores extrínsecos relativos à condição social, à personalidade e à postura criativa. Essa mencionada coleção posteriormente deu origem ao Museu de Arte Bruta de Lausanne (Suíça), inaugurado em 1976.
› Vista da exposição A. R. L. –Vida e obra, no Centro Cultural Banco do Brasil, Brasília, 2024. Obras de Antônio Roseno presentes na imagem: Nossa Senhora Aparecida, 1989. Sereia, 1990. Foto: Artur Lins.
Na década de 1970, a discussão sobre a “arte bruta” se expande com contribuição do inglês Roger Cardinal, historia- dor da arte, que traduz aquele termo para o léxico anglófono: outsider art. Com o novo termo, ocorreu um alargamento semântico que contempla novos atores marcados por distintas situações de marginalidade: além dos outsiders tradicionais, foram incluídos artistas populares, autodidatas, étnicos, moradores de rua, idosos, prisioneiros. A categoria então parecia abranger tudo aquilo que escapava ao mainstream. Nas décadas subsequentes, a outsider art ganhou destaque entre instituições museológicas, galerias e feiras comer- ciais de arte no mundo inteiro. Simultaneamente, emergiu uma crítica ao caráter impreciso e, até certo ponto, mercadológico dessa classificação. Tomou vulto a percepção de que as margens são definidas pelo centro em uma operação simbólica não muito distante do paternalismo e do etnocentrismo. A ideologia de uma arte completamente livre dos condicionamentos sociais e estéticos também foi abalada pela diminuição dos fatores ligados ao isolamento. Além disso, à medida que os chamados outsiders foram sendo parcialmente integrados, a própria relevância do termo é posta em dúvida. Contudo, resta, embora com reservas críticas e através de uma estratégia compensatória, uma inclinação do sistema da arte atual para a assimilação de man festações criativas contra-hegemônicas que deriva desse percurso trilhado ao longo do século XX.
Nesse percurso histórico são decisivas as profundas mudanças no sistema da arte desencadeadas a partir da década de 1960. O pós-modernismo desafia a autonomia da arte, borrando fronteiras antes estabelecidas, as quais demarcavam a separação das dimensões estética, política e comercial. A virada pós-moderna representa uma perda de certeza, com a debacle de um centro estético unificador e o enfraquecimento de padrões con- sensuais de excelência cultural. Como consequência, afloram formas híbridas e misturas ecléticas de códigos, validam-se as margens, ao passo que afluem discursos identitários. Assim como obser- vou a socióloga Vera Zolberg, há nítidas afinidades entre o pós-modernismo e a consolidação de um segmento no interior do sistema artístico dedicado a autorias marginalizadas que estão inscri- tas em classificações como outsider art, art brut, self-taught art, folk art, identity art. A biografia, portanto, é alçada ao primeiro plano das conside- rações avaliativas da arte.
OS CIRCUITOS ALTERNATIVOS DE ARTE NO BRASIL
Agora vejamos como esse proces- so aterrizou no Brasil do século XX. As primeiras coleções de objetos da cultura material popular são tribu- tárias de esforços assistemáticos de instituições como o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, e os Institutos Históricos de capitais como Salvador e Recife. Ainda no início da primeira metade do século XX, formaram-se coleções que delimitavam o escopo da contribuição cultural do povo brasileiro. No entanto, o interesse permanecia restrito aos aspectos históricos, etnográficos e folclóricos. Somente ao final da década de 1930 e durante a década de 1940 que se intensificou a busca pelo valor estético da produção plástica popular.
No terreno da pintura, Cardosinho, bem incentivado por Portinari, inseria-se em exposições desde 1937. No ano seguinte, o projeto da Missão de Pesquisas Folclóricas, estimulado pelo Departamento Municipal de Cultura de São Paulo, então sob comando de Mário de Andrade, levou ao reconhecimento, por parte do arquiteto Luís Saia, do ex-voto de madeira como elemento icônico da cultura popular nordestina. Com maior força na década de 1940, artistas, intelectuais e variados membros de uma reduzida elite cultural brasi- leira passavam a se interessar, muito influenciados pelas tendências captadas do estrangeiro, pela expressão estética de artistas marginalizados. Destacam-se o colecionismo do pernambucano Abelardo Rodrigues e a estetização do artista baiano Mário Cravo.
› Macaco. Antonio Roseno 1961. Foto: Artur Lins.
Marco importante desse processo histórico foi a exposição Cerâmica Popular Pernambucana, em 1947, ocorrida na Biblioteca Castro Alves do Rio de Janeiro, com a curadoria do artista Augusto Rodrigues, irmão de Abelardo, o responsável por apresentar Vitalino Pereira dos Santos ao circuito artístico carioca. Como desdobramento, em 1949, o MASP ofereceu ao público paulistano a mostra Arte popular pernambucana. No mesmo ano, no contexto dessa cena artística atenta aos outsiders, figurou, por consequência de um experimento da médica Nise da Silveira com pacientes do Centro Psiquiátrico Pedro II, a exposição 9 artistas do Engenho de Dentro, sediada no Museu de Arte Moderna de São Paulo, com a curadoria de Léon Degand e Mário Pedrosa. Já na primeira Bienal de São Paulo, em 1951, havia a participação de pintores populares como Heitor dos Prazeres e José Antônio da Silva.
Nas décadas seguintes, entre 1950 e 1980, as artes populares foram, paulatinamente, sendo assimiladas pelo sistema da arte brasileiro, configurando no seu interior um circuito alternativo. Em face desse segmento, não somente surgem instituições museológicas especializadas, mas os grandes museus de arte passam a contemplar artistas populares com exposições coletivas e individuais, ao passo que uma nova modalidade de colecionismo se instituía. Deu-se, nesse período, o aparecimento de estudos voltados ao gênero, bem como o firmamento de um comércio animado por galerias, antiquários e marchands de diversas estirpes.
É válido mencionar a Galeria Oxumaré, de Salvador, que ainda na década de 1950 conferia espaço à produção plástica popular. Na década de 1970, aparecem galerias como O Bode, em São Paulo, comandada pela fotógrafa Maureen Bisilliat; e Nega Fulô, no Recife, gerida pela pesquisadora Silvia Coimbra. O contato dos artistas populares com esse circuito artí tico em ascensão, então formado por instituições, intermediários, comerciantes e colecionadores, transformou a materialidade dos objetos da arte popular. A produção se desvinculou, parcialmente, do contexto de origem, caminhando na direção das expectativas estéticas externas de um público consumidor metropolitano.
Disso decorre um processo de individualização, os artistas passam a ser vistos como autênticos, inde- pendentes da tradição comunitária,eosobjetospassamaserassinados e produzidos já com a intenção de serem incorporados por coleções públicas e privadas. Se a pintura naïf desde o princípio já era entendida como arte, no campo da escultura popular leva-se mais tempo para que haja o deslocamento do “artesanato” para a “arte” no plano discursivo dos receptores.
Por consequência desse circuito artístico alternativo, o conceito de arte popular modifica-se, abrangendo não somente manifestações artesanais marcadas pelo peso da coletividade e da tradição, mas se aproximando do amplo espectro daoutsider art em que a singularidade e, principalmente, a não conformidade são atributos exaltados.
Observo que, se, por um lado, no estrangeiro termos como outsider art e self-taught art são amplamen- te empregados, no Brasil, por outro, é o conceito de arte popular que cumpre uma função aglutinadora das manifestações estéticas marginalizadas, mesmo quando elas são, crescentemente, integradas pelo sistema. Resta discutir o modo de integração dessa marginalidade artística no mundo contemporâneo.
› Antonio Roseno Sapo, 1988. Foto: ArturLins
DAS MARGENS AO CENTRO: O POPULAR NA CENA CONTEMPORÂNEA
Nos últimos cinco anos, bastaria a qualquer um ter feito breves visitas a feiras comerciais como ArtRio e SPArte para perceber o lugar de destaque que os artistas ditos populares, vivos ou falecidos, galgaram no mercado da arte brasileiro. A façanha não se restringe à fronteira nacional. O pintor Chico da Silva, recuperado, no ano passado, por uma exposição individual na Pinacoteca de São Paulo e depois de ser contemplado por uma mostra solo em Nova York na David Kordansky Gallery, teve uma obra sua arrematada pelo valor de 330 mil dólares em um evento organizado pela Sotheby’s, uma das maiores casas de leilão do mundo. Cresce o número de galerias privadas que, atualmente, comercializam e expõem a arte popular brasileira. Ao menos desde 2016, percebe-se como o MASP alterou sensivelmente o seu programa curatorial para incluir, com mais frequência, exposições e aquisições de acervo voltadas aos artistas populares. Índice dessa recente valorização, a contrafação da arte popular se tornou uma prática recorrente, assim como foi noticiado pela Folha de S.Paulo, no mês de maio, o caso da falsificação de obras da artista Maria Lira Marques, laureada neste ano com uma exibição inteiramente indivi- dual no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo.
Visivelmente são abundantes os exemplos de como figuram as artes populares na cena contemporânea. Entretanto, debruço-me, agora, sobre o exemplo específico de um artista radicado no interior de São Paulo. Antônio Roseno de Lima (1926-1998), originário de Alexandria, RN, foi um artista brasileiro que contou uma trajetória típica de migrantes nordestinos que vieram a se somar à força de trabalho do estado em meados do século XX. Deixando para trás a ex-esposa, os filhos e sua terra natal, em 1959, Antônio muda-se para a cidade de São Paulo, onde cria vínculos familiares e, junto à sua nova mulher, principia vendendo doces na Estação da Luz. Em 1961, por meio de um instrutor espanhol, Roseno conhece a fotografia, que lhe aparece como atividade profissional desempenhada tanto na capital quanto no interior, em Indaiatuba, onde posteriormente fixou residência. No mesmo período, ele começa a desenhar e pintar sem nenhum sucesso comercial. Falido em 1976, muda-se, com a esposa, para a favela Três Marias, em Campinas, lugar onde viveu, em situação de pobreza e acompanhado de comorbidades físicas e mentais, até o momento de sua morte.
A sorte de Roseno, em matéria de reconhecimento, altera-se somente quando foi descoberto por um acadêmico em uma exposição de pintura primitivista na Universidade Estadual de Campinas. Geraldo Porto, afetado pela obra, organiza, em 1991, a primeira exposição individual do artista na galeria Casa Triângulo, situada na cidade de São Paulo, fundada por Ricardo Trevisan. Dali em diante, seguiu-se um percurso de forte atenção midiática, tendo sido Roseno assunto dos principais jornais do estado, o que lhe rendeu a procura de colecionadores brasileiros e de instituições estrangeiras. Expôs em Nova York, na Calvin Morris Gallery, em 1995, bem como em instituições na Alemanha, em Frankfurt, Berlim e Hei- delberg. Obras desse artista integraram a famosa Collection de l’Art Brut, em Lausanne, Suíça.
"A imaginação de Roseno, um reflexo da sua história de vida, transita desde a herança rural do seminário nordestino, migrando pela urbanidade da metrópole paulistana."
Desde 2022, sob curadoria do professor Geraldo Porto, a obra de Roseno tem sido revisitada pela exposição itinerante intitulada A. R. L. – Vida e Obra, que ganhou espaço em importantes museus de Campinas – Museu de Arte Contemporâ- nea e Casa de Vidro – e agora, em 2024, chegou ao circuito de exibições do Centro Cul- tural Banco do Brasil, até o presente momento em Belo Horizonte e em Brasília. Isento de instrução formal, Roseno adquiriu uma sensibilidade estética por meio da fotografia e dos lambe-lambes que distribuía nas ruas. Ele era muito atento aos materiais publicitários, aos rótulos de mercadorias variadas, às figuras de enciclopédias escolares, às imagens que circula- vam em revistas e jornais e aos conteúdos gráficos de notas de dinheiro. Tendo como suporte as suas fotografias, o artista iniciou colorindo-as à mão, promovendo colagens e inscrevendo nelas mensa- gens. A pintura resulta desse aprendizado. Entre os principais temas, destacam-se os animais (galos, bois, macacos, gatos, onças), os campos floridos e os frutos, as figuras femininas (sereias e Nossa Senhora), as personalida- des da vida pública brasileira (ex-presidentes, intelectuais e inventores), os recortes da vida moderna (indústrias, arranha-céus, automóveis) e, marca registrada, a série de figuras de um homem bêbado vestindo um chapéu, com a boca e os olhos duplicados e embaralhados, criando-se a ilusão óptica de movimento.
› Antônio Roseno, Carro, 1993-1994. Foto: Artur Lins.
Não basta que os marginais sejam integrados; é preciso saber se o modo de integração realmente faz justiça.
A imaginação de Roseno, um reflexo da sua história de vida, transita desde a herança rural do semiárido nordestino, migrando pela urbanidade da metrópole paulistana. As figuras recebem o contorno de linhas pretas, o emprego de cores vibrantes e chapadas, além do acabamento da superfície com esmalte sintético puro. Não há obediência à proporção, à gravidade e à perspectiva. Algumas mensagens são escritas na frente e no verso dos quadros, retratando pensamentos íntimos do artista, informações diversificadas, questões relativas ao processo criativo e à datação dos desenhos. Conquanto longe dessas referências, Roseno aproxima-se tanto da pop art quanto da art brut. Há muita liberdade naquilo que o artista propõe. A origem modesta e o pertencimento de classe, assim como outras características estéticas, nos permitem pensar: trata-se de uma expressão singular da nossa arte popular brasileira.
Que um artista como Antônio Roseno seja apresentado em um lugar privilegiado de exibição como o CCBB não é algo fortuito. Atualmente, somos testemunhas de esforços continuados pela inclusão das artes visuais populares, antes inteiramente marginalizadas e subapreciadas, no escopo da cultura legítima nacional. Contudo, isso não quer dizer que as hierarquias simbólicas foram de algum modo voluntariamente des- truídas. Permanecem as relações desiguais de poder e dominação. Não basta que os marginais sejam integrados; é preciso saber se o modo de integração realmente faz justiça. Apenas é de se observar que o sistema possui aberturas; e elas devem ser bem exploradas no sentido de demo- cratizar os acessos e os conteúdos.
› Antônio Roseno, O Gale É Marido Da Galinha, 1987. Foto: Artur Lins.
Artur André Lins
Nascido em 1994, em Brasília, é pesquisador da área de Sociologia da cultura com ênfase em patrimônio imaterial, artes visuais e economia criativa. Assina artigos acadêmicos nas áreas de Sociologia da cultura e de Teoria e pensamento social. Em 2022, recebeu o Prêmio Sílvio Romero do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. No ano seguinte, publicou o seu primeiro livro, intitulado O circuito das artes populares no Brasil: o caso do povoado Ilha do Ferro (AL). Artur é formado em Sociologia pela Universidade de Brasília (UnB), mestre em Sociologia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e, atualmente, cursa o doutorado em Sociologia na UnB.
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