O que pode ser Mediação Cultural?
- Célia Barros

- 1 de ago.
- 6 min de leitura
— org. Célia Barros
Paula Monterrey
Idealizadora do projeto Repertório Aberto junto a Andrea Mendes, em parceria com o Museu de Arte Contemporânea de Campinas “José Pancetti” (MACC) para desenvolvimento de propostas educativas e de vinculação entre o museu e a população de Campinas no ano de 2025, por meio de projeto aprovado pelo ProAC.
Meu entendimento perpassa realidades que vejo, latências que percebo e possibilidades que investigo. A mediação cultural nas exposições em que trabalhei tem sido experiências distintas entre si. Por um lado, em exposições institucionais, envolvendo itinerância de exposições e acervos de museus e outras grandes instituições culturais pelo interior do estado, a realidade perpassa pelo serviço, que muitas vezes garante número de visitantes, que, por sua vez, respalda o investimento feito com o trânsito da exposição. A expectativa de formação de público se esvazia, muitas vezes, pela curta duração das exposições e pela falta de regularidade de mostras em uma mesma instituição e, consequentemente, pela despreocupação coma formação de setores educativos fixos que possam propor programas de longo prazo num contexto institucional junto aos mais diversos públicos e grupos sociais. Por outro lado, configuram-se também como experiência de troca importante e de validação profissional, uma vez que se apresentam como escassas oportunidades de trabalho um pouco mais estruturadas, sendo um acesso importante de trabalhadores da mediação a contextos institucionais da cultura e a conhecimentos laborais acumulados pelo setor. Além disso, a polivalência das instituições culturais do município onde atuo, que muitas vezes tem como carro-chefe outras programações e linguagens artísticas, colocam a equipe de mediação como referência e importante apoio para o funcionamento de uma exposição de artes visuais.
As trocas são muitas e potentes, mas também podem causar acúmulo de funções, considerando ainda as equipes de trabalhos enxutas dos espaços culturais do interior paulista. O processo de mediação torna-se, muitas vezes, estendido à relação com profissionais terceirizados, equipes de limpeza, portaria, serviços técnicos de manutenção, orientação de público e conteúdos de comunicação e representação junto à imprensa. Sem falar no entorno, com o trânsito de educadores pelos pequenos comércios, restaurantes, pontos de ônibus e afins. Quando mencionamos nosso trabalho, é comum escutar: “Nossa, não sabia que tinha uma exposição ali. Qualquer um pode entrar?”. A falta de constância e continuidade dos educativos nesse contexto torna cada artista educador e mediador cultural, profissional autônomo, arquivista de sua pesquisa e sua prática, sendo muitas vezes a parte mais interessada na documentação de suas mediações e seus conhecimentos cultivados, transbordando seu fazer do contexto institucional e muitas vezes se consolidando como engajamento transversal dentro do cenário cultural do município, a partir da organização com coletivos, participação de movimentos culturais, articulação com escolas e organizações do terceiro setor etc. Quando os educativos são propostos por projetos independentes ou exposições de pequeno porte fomentadas por editais municipais e estaduais de incentivo à cultura, esses educativos assumem as mais diversas formas, por vezes mais conservadoras como o formato de monitoria, outras mais transformadoras e integradas aos projetos como um todo, quando muitas vezes essas redes cultivadas pelos artistas educadores e mediadores culturais são fundamentais para a construção de sentido coletivo para as mostras em seus territórios. Todas essas características trabalhistas e do meio impactam e deveriam ser consideradas numa reflexão a respeito da mediação cultural nos interiores. Percebo, apesar da precariedade trabalhista dessa classe profissional, a potência que existe nas equipes interdisciplinares formadas por profissionais, uma vez que é impossível se dedicar exclusivamente a ações de mediação em exposições, provenientes da educação não formal, educação popular, educação formal e oficineiros de arte educação, que geram a cada trabalho novos valores e significados para a educação em contexto de exposições. Há cumplicidade na troca entre esses profissionais que subvertem a competitividade do mercado de trabalho tradicional. Essa forma de se relacionar muitas vezes desenrijecem as convivências hierárquicas institucionais e encantam os espaços junto à presença dos públicos. Em contextos de exposições de menor porte, normalmente de artistas locais, as medições têm grande potencial de articulação com o território, promovendo momentaneamente novos regimes de visibilidades e deslocamentos enunciativos no convite a movimentos sociais, coletivos, grupos e comunidade escolar em contexto expositivo. Essas experiências me fizeram atrelar minha prática como mediadora cultural a pesquisas a respeito dos Direitos Culturais, nesse transbordamento da atuação para além das exposições.
A ação junto a coletivos culturais e sociais, o gerenciamento de pesquisas, o mapeamento de agentes culturais parte de grupos minorizados e, atualmente, a representação da sociedade civil no Conselho Municipal de Política Cultural faz e parte, para mim, da minha experiência como mediadora cultural e educadora em contextos de exposições. Gosto da compreensão dePaul B. Preciado, quando curador da Documenta de Kassel, de que as exposições, tendo como origem a história dos museus, trata-se de um dispositivo pedagógicopolítico-ético-estético. Naquele momento, ele propõe o desapego do formato expositivo em detrimento do Parlamento de los Cuerpos. A partir dessa provocação, eu entendo as exposições como uma linguagem, cuja decodificação não pode ser naturalizada ou banalizada.A equipe de mediação cultural, que por vezes tampouco se sente pertencente ou familiarizada com essa linguagem, é a principal testemunha do encontro dessa linguagem com as mais diversas linguagens dos públicos. É quem presencia os gestos das crianças, as risadas das amigas,os olhares de desconfiança dos grupos de adolescentes, as imitações com o corpo, o toque interrompido, os conflitos éticos, estéticos e epistêmicos... o que construímos com isso descobrimos a cada novo contexto, de exposição em exposição.
Janaína Maria Machado
Coordenação do educativo da exposição MAJ – 30ª Mostra de Arte Juventude, Sesc Ribeirão Preto em 2022, curadoria de André Pitol e Luciara Ribeiro.
A mediação é o ponto central entre o discurso artístico e os públicos. É quem faz os atendimentos – é a escutada exposição e da instituição, ultrapassando os limites do projeto expositivo. Estar num contexto de mediação no ambiente das artes visuais significa promover conversas e escuta dos públicos em relação ao objeto artístico, assim como é fonte de investigação da própria prática de mediação.
Eri Alves
Coordenação do educativo da exposição Mirantes, de Stela Barbieri, fiz a coordenação educativa com as minhas sócias, Carolina Velásquez e Bianca Zechinato, da KA arte educação, no Sesc Registro em 2018.
A mediação cultural, nesse caso funcionou muito como facilitador para fruição da instalação da artista, mas também como um trabalho social, já que os educadores eram da área de Pedagogia (único curso superior da região) e não tinham noção do que era conversar sobre arte com o público.
Luciano Favaro
Coordenador, junto à artista Julia Viana, do Projeto Solo Sul, no Sesc Jundiaí em junho de 2019. Nele, permanecemos durante todo o período de exposição do projeto junto ao público, como uma forma de conversar sobre os temas que as obras abordam. Nesse momento, a fronteira
entre o/a artista e o/a educador/a se diluem.
Para mim, a mediação estabelece vínculos entre a exposição e o público. Esse vínculo surge através da sensibilidade por parte do educador, percebendo onde uma obra toca o visitante, e, a partir de então, desenvolver um diálogo sobre questões relacionadas à arte, mas também sobre a vida, a sociedade e outros pontos que podem surgir quando o encontro de qualidade acontece. Vivemos um momento em nossa sociedade onde os pontos de vista parecem estar bastante enrijecidos. Assim, acredito que o papel da mediação hoje, para além de ter boas respostas, é compartilhar boas perguntas. Porque através de boas perguntas podemos promover um espaço de reflexão coletiva, no intuito de questionar e ampliar a percepção que temos ao nosso redor. Acredito profundamente na arte educação e em sua potência como ferramenta de reflexão e transformação social. Sinto que, depois da pandemia, o setor está passando por um momento delicado. A diminuição do número de exposições e a permanente precarização do trabalho do educador são desafios urgentes que nossa classe precisa enfrentar.
Malba Oliveira
Coordenação Educativa da 31ª MAJ ( Mostra de Arte da Juventude) do Sesc Ribeirão Preto, que aconteceu de dezembro de 2024 à junho de 2025.
As mediações em espaços expositivos de artes visuais são reavivamentos do ambiente, das lógicas e dos modos de relação. São processos metodológicos que envolvem algo essencial para a expansão dos modos de fruição dos públicos: o encontro! Vivo, ativo e permeado pela presença. Esse encontro, que não se dá por mero acaso, promove a possibilidade de alimentar a conexão, a leitura e o desdobramento das reverberações das obras de arte. Essa prática, presente na ação educativa de uma equipe, vai muito além da transmissão de informações. Tratase de ativar percepções; criar estados sensíveis de aprendizagem; promover estímulos para uma relação crítica e/ou afetiva com as obras. É uma prática intencional, que considera as bagagens e os desejos de quem propõe o encontro e de quem realiza a visita.





Comentários